CANTO À UNIÃO SOVIÉTICA


I – 7 de novembro
Se tiveres diamantes, traz o mais puro diamante. Se belas rosas cultivas em teu agreste jardim, traz a rosa mais vermelha, a mais agreste das flores.
Traz o pão que tu fizeste com o trigo das tuas mãos.
Traz a mais doce canção, a branca luz matutina rouba uma estrela do céu, rouba um sorriso da noiva, no dia do casamento.
Traz também teu coração, que é para um presente fazer.

II – INVOCAÇÃO
Agora que novamente chacais aguçam os dentes para atacar-te; quando os lobos esfaimados se soltam na noite, querendo morder teu ventre criador; quando as hienas ávidas de sangue pensam cevar-se nos cadáveres de novos mortos; quando os bandidos se encontram nas encruzilhadas do mundo para trocarem as armas com que violar novamente tuas terras de fartura; nesta hora inquieta, quase noturna e perigosa, levanto minha voz até ti, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, mãe, Irmã e amada minha.
Nesta hora escura de turvos assassinos, invoco teu nome de mariposa e águia,de flor e tempestade, e, quando digo U.R.S.S, ouço o eco dos povos repetindo teu nome traduzido: PAZ significa.

III – ESPERANÇA DO MUNDO

Sei que na última dobra da noite odiosos olhos te espiam, ávidos do teu sangue de pássaro e gigante, ávidos de esmagar tua presença de canto e esperança, ávidos de morder tua carne e ver morrer até tua sombra de livros e tratores.
Sei que os criminosos, os ricos assassinos, os linchadores de negros, os sugadores de sangue de operários, os traficantes de dólares e libras, os donos de terra, os senhores dos servos na imensidão dos campos, tramam contra ti, querem te apagar do mundo como o ladrão apaga a luz que o denuncia.
De ti vêm a esperança e a doçura do mundo; a certeza do homem, o amor vem de ti. Teu corpo é construído de realidades milagrosas, de farinha de leite, de trigo e de canções, de carvão e de petróleo, de livros e de flores, de fábricas e kolkozes, e em ti cada um é feliz, e o será ainda mais amanhã, e sempre mais e mais.
Teu corpo construído de homens e mulheres, de heróis e operários, construído por Lênin e Stálin, conservado no sangue dos que bateram quando outros assassinos quizeram te morder e te apagar.
De ti vêm a esperança e a doçura do mundo; a certeza do homem, o amor vêm de ti.

IV – TUA INVENCIBILIDADE
Os criminosos afiam punhais, lustram fuzis, metralhadoras; Mister Truman engraxa sua bomba atômica, mas nós te fitamos, União Soviética, e sabemos que és imortal e invencível. Porque estás dentro de cada um de nós também, te estendes muito além de tuas largas fronteiras, teus vastos limites são os povos do mundo.
Ontem nos defendentes a todos, nos salvaste a todos sem exceção, mesmo aos que hoje se voltam contra ti, pequenos assassinos.
Quando a noite nos cobriu de ignomínia, de medo e de rancor, de prantos e de luto, tu trouxeste a luz do dia livre, amassada pelo sangue dos teus filhos, redimida pela luta que travaste, pela guerra que venceste.
Ontem nos salvaste a todos, sem exceção. Se vivos somos, é a ti que devemos; se comemos, esta comida nos foi dada pelas vidas que deste em sacrifício; se bebemos, essa água é água tua de uma fonte que abriste com fuzis.
Foram teus filhos, teus soldados, que nos deram esse dia de hoje que vivemos, e que nos dão a certeza de vivermos esse dia de amanhã com que sonhamos.
Ontem nos salvaste a todos, sem exceção, União Soviética, mãe, irmã, amada minha.

V – SEI DE HOMENS…
Sei de um homem preso, protestou contra a injustiça,desejava um mundo belo, não amava as coisas feias nem os sujos espetáculos. Prenderam suas mãos para calar sua boca. Do fundo de sua cela, ele levanta o olhar, seu pensamento voa mais além do mar e das montanhas, do Brasil ardente aos teus campos nevados.
Ele te fita, União Soviética, e sabe que sua luta não é vã, que seu sacrifício não é inútil. Ilumine o fundo das prisões das ditaduras, alimentas os sonhos e a liberdade.
Sei de um poeta perseguido em sua pátria, seu crime foi pedir mais um pão para os mineiros, seu crime foi gritar contra os que vendem sua pátria nos balcões de Wall Street. Escondido em alguma parte por trabalhadores, ele pode dizer a seu povo chileno: “Lutemos sem temor porque o socialismo avance e brilha sobre o Kremlin a estrela matutina.
Sei de um negro cujas mãos faziam a doce brancura de açúcar de cana, ilha de Cuba, em meio ao oceano. Milhares de negros o seguiam, ele dizia que era necessário arrancar a bandeira norte – americana das torres de Havana e da verdura dos canaviais.
Foi morto pelas costas, em dólares pagaram ao assassino o preço do seu crime. Mas os negros de Cuba continuam a andar para diante seu caminho, porque, na noite ianque sobre a Grande Antilha, uma luz eles enxergam, é tua chegada de Moscou resplandecente.
Sei de um homem perseguido, não tem casa, nem pouso, nem direito a descansar na sua cabeça no regaço da irmã, nem a ouvir a doce voz da filha. Mataram sua esposa na  noite do nazismo, os caminhos do exílio a sua mãe a mataram. Os vis policiais do meu Brasil percorrem, do norte ao sul, da selva ao oceano, buscando o rastro desse homem perseguido.
Seu crime é lutar contra a miséria, seu crime é desejar sua terra livre. Seu crime foi dizer que o povo brasileiro, a guerra contra ti jamais fará. O povo brasileiro o guarda bem guardado e pensa: “Um dia ele aqui construirá a grandeza que na Rússia construíram Lênin e Stálin seus mestres bem – amados”.
São milhões, União Soviética, os que clamam da América Latina, repetindo teu nome de paz, decididos a levantar até as pedras dos caminhos se os escravos do dólar ousarem te atacar.

VI – SAUDAÇÃO
Nesta hora incerta, de inquietude e ameaças, eu te saúdo em nome desses povos que lutam com os dentes as unhas e os pés contra os senhores dos dólares, os linchadores de negros.
Venho de longe para te saudar, e te saúdo desde o fundo das prisões, dos subterrâneos ilegais, dos “mettings” metralhados, dos jornais proibidos, dos livros queimados e dos heróis assassinados.
Saúdo-te em nome de milhões de pobres, explorados e oprimidos, negros, índios e mulatos, brancos e amarelos, os latino-americanos.
Não estão parados nem caídos. Estão de pé e te saúdam, os punhos levantados. E mandam que te diga: “Não será com nossas mãos que violarão tuas fronteiras de fartura.  Não será de nossas bases que voarão os bombardeios que farão guerra contra ti. Conquistaremos o direito a decidir nosso destino, te daremos as mãos e juntos marcharem para o futuro e tu nos guiarás.
Isso mandaram que te dissesse, brasileiros, chilenos e cubanos, argentinos e uruguaios, homens de toda a América, da Patagônia ao México. Em seu nome eu te saúdo, União Soviética, esperança do mundo, certeza do homem.

O Mundo da Paz – Jorge Amado
Editorial Vitória: Rio de Janeiro, 1952