Retirada das tropas estadunidenses do Oriente Médio
 
O presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou no dia 14 de abril, a completa retirada das tropas do Afeganistão e do Iraque, o que já era esperado e prometido desde janeiro de 2009, quando Obama tomou posse em seu primeiro mandato. Trump, que tomou posse em janeiro de 1917, havia dito a mesma coisa. Mas, nada foi feito de concreto até agora.
 
Pelo menos 10 mil soldados seguem presentes no Afeganistão e pelo menos mais outros cinco mil em cinco bases militares ainda estão no Iraque. Apesar do parlamento iraquiano ter decidido por unanimidade exigir dos EUA completa desocupação de seu território em janeiro de 2020.
 
Vocês sabem que eu não estou entre aqueles analistas internacionais que dizem que não há diferença nenhuma entre Biden e Trump, que é tudo igual, tudo a mesma porcaria. Eu não estou entre os que analisam desta forma. Eu sou marxista, sou dialético, as coisas mudam e as coisas se transformam. A correlação de forças no mundo está sendo alterada. Venho dizendo há tempos que vivemos um mundo em transição, da unipolaridade de 1991 para a multipolaridade, que ainda não se consolidou.
 
A retirada do Afeganistão é a mais emblemática. Do Iraque, de fato, seria uma questão de tempo. No Afeganistão eles já tiveram 100.000 soldados. Eles gastaram, em 20 anos, que completa agora em outubro de 2021, cerca de dois trilhões de dólares. Essa é a maior e mais longa ocupação militar que os Estados Unidos já fizeram em toda sua história. Para dominar um dos países mais pobres do mundo, cujo PIB é de menos que 20 bilhões de dólares!
 
No caso do Afeganistão, a retirada – que é um fato positivo – deve começar no mês de maio e vai se completar em quatro meses, até setembro, quando está prevista a completa desocupação, de forma que toda a segurança nos dois países, será feita exclusivamente pelas forças desses mesmos países. Há quem diga que no caso afegão, os talibãs, que ocupavam o poder até outubro de 2001, devem voltar ao poder central.
 
A pergunta que sempre se faz é por que eles ocuparam um país pequeno e sem papel econômico algum.  Por causa da geopolítica, de uma estratégia de dominação regional e também, dizem, eles sempre acreditaram que ali seria o centro que emana terrorismo para o mundo inteiro. Que ali é o berço da Al-Qaeda.
 
Aliás, a Al-Qaeda foi formada pela CIA. Bin Laden é de uma família riquíssima da Arábia Saudita. Tem parentes nos Estados Unidos, que são amigos da família Bush no Texas. E essa família mantém comércio de petróleo nos Estados Unidos. Eles são muçulmanos de orientação sunita. E por que a CIA financiou e treinou esses guerrilheiros do Afeganistão, vinculados à Al-Qaeda, ao Osama Bin Laden? Porque, a União Soviética ocupou o Afeganistão em 1979, a pedido do governo do Afeganistão.
 
Então, não foi uma invasão. Igual ao que ocorreu no Líbano, que pediu para a Síria colocar soldados no país, para poder evitar a guerra civil de 1990. Quando acabou a guerra civil nesse ano, depois de 15 anos de guerra, o exército Libanês não seria suficiente para garantir a paz e por isso chamaram o país vizinho, amigo, o Líbano que um dia pertenceu à Síria. Isso não caracteriza uma invasão.
 
A Rússia ficou no Afeganistão por dez anos, de 1979 até 1989. Alguns autores dizem que o Afeganistão foi o Vietnã da antiga União Soviética. Os Estados Unidos perderam no Vietnã. A União Soviética, perdeu também. Saiu em 1989, o ano que caiu o muro de Berlim. Portanto, o chamado bloco socialista, estava desmoronando e, aí, eles retiraram-se do Afeganistão. Nesses dez anos, os guerrilheiros que atacavam os soldados do exército vermelho, todos anticomunistas, evidentemente, eram financiados, treinados e armados pelos Estados Unidos.
 
Eles eram chamados na imprensa estadunidense de “Warriors freedom”, ou “Guerreiros da Liberdade” (sic). Então, foram “Guerreiros da Liberdade”, em um certo período e viraram terrorista no outro período. Não é estranho isso? Vejam como tudo é relativo. Saddam Hussein, entre 1980 e 1988, atacou o Irã, na tristemente famosa Guerra Irã-Iraque, onde morreram um milhão de pessoas.
 
Nesse período que ele atacou o Irã, ele era chamado nos Estados Unidos de presidente Saddam. Ele tinha dado golpe de estado com oficiais baatistas em 1979. Em 1988, depois que terminou a guerra contra o Irã, ele passou a fazer duras críticas e oposição aos Estados Unidos. Aí a imprensa passou a chamá-lo de ditador Saddam.
 
Rússia defende a Síria
 
A segunda grande novidade é o ataque que a Rússia fez na Síria no último dia 19 de abril, em dois acampamentos de terroristas, que são financiados pela Arábia Saudita. Esses terroristas e mercenários são fortemente armados. Para se ter uma ideia, uma metralhadora, fuzil de repetição, aquele Ak-47, Kalashnikov, custava no mercado paralelo, antes do início da tal primavera árabe em 2011, US$200 dólares apenas.
 
Hoje, para você comprar uma metralhadora dessas Ak-47 você gastará pelo menos US$ 1.500,00. Por que o seu preço foi inflacionado? Porque a Arábia Saudita jogou dois bilhões de dólares para financiar a derrubada do governo do Dr. Bashar Al Assad, com apoio dos Estados Unidos.
 
A Al-Qaeda, na Síria, chama “Frente Al Nusra”, que também é financiada pela Arábia Saudita e pelos Estados Unidos, que lhes dão treinamentos e equipamentos. Os Estados Unidos também têm soldados, coturnos em solo sírio. Eu consultei vários amigos sírios e libaneses sobre quantos soldados eles ainda têm lá. Não tem uma precisão. Fala-se de dois a quatro mil.
 
Biden ainda não anunciou a retirada desse contingente de soldados. Mas eles vivem em dificuldades, porque eles estão acossados pelo próprio exército sírio. E esse acampamento de terroristas foi atacado pela aviação russa. Temos registro de que eles mataram pelo menos 200 terroristas. Tenho um amigo sírio que sempre diz que eles foram conversar com os seus ancestrais.
 
Mas, foram eliminados também 24 picapes com metralhadoras pesadas. Picapes Toyota, tudo isso foi estraçalhado, virou pó. Isso é muito interessante, porque vai enfraquecendo aquilo que já está muito fraco, que é o chamado Daesh ou Isis, na sigla inglesa, que é o famoso Estado Islâmico, que está com seus dias finais.
 
Eu sempre digo que esse grupo Daesh não é nem Estado e não é Islâmico. Não é Estado, porque não governa nada. Praticamente já foram todos expulsos do Iraque e da Síria. E também não é islâmico, porque o livro sagrado dos muçulmanos, o Alcorão, não diz que tem que cortar cabeças de cristãos. Ao contrário. O livro sagrado diz que é dever fundamental dos muçulmanos protegerem cristãos e judeus.
 
Eleições na Síria
 
Ainda sobre a Síria, eu quero registrar que em maio terão eleições. No meio desse cenário de muita destruição e ainda ações terroristas, a Síria está sendo reconstruída e vão realizar eleições nesse período e nessas condições difíceis. Muitas cidades sírias, como Palmira, Maalula, Alepo, Homs, quase tudo foi inteiramente destruído, prédios inteiros derrubados. Então, uma situação difícil. Mas, teremos eleições.
 
O presidente, Dr. Bashar al-Assad, médico oftalmologista, formado na Inglaterra, um muçulmano, um árabe que fala vários idiomas. Não é e nunca foi hostil ao ocidente. Como também a China, por exemplo, não é hostil aos Estados Unidos. Por que, então, os Estados Unidos querem derrubar o Bashar? Porque ele é anti-imperialista, porque ele defende a soberania nacional síria, a autonomia, a independência da Síria e de todos os países árabes. Registro que no dia 17 de abril comemorou-se na República Árabe Síria o seu 75º ano de sua independência nacional.
 
Os Estados Unidos levaram para o Oriente Médio só destruição. Destruíram a Líbia e mataram o seu presidente. Destruíram o Iraque e mataram o seu presidente. Destruíram a Síria mas não conseguiram matar o seu presidente, ainda que o objetivo fosse esse. Eles perderam essa guerra e vêm perdendo espaço no Oriente Médio.
 
A Rússia está ocupando esse espaço. Agora vemos a China plantar seus dois pés naquela região, por causa do acordo com o Irã. E os Estados Unidos estão recuando, vão agora retirar as tropas. Vão ficar cada vez mais isolados na região.
 
Os únicos países que mantém relações com Israel e os EUA, são aquelas monarquias do Golfo Pérsico, que são sete, todas governadas por monarcas  de extrema-direita. Algumas delas são feudais, como a Arábia Saudita, que nem Constituição possui, não tem partidos políticos funcionando.
 
A eleição na Síria será no dia 26 de maio. Dr. Bashar registrou no dia 21 de abril a candidatura no equivalente ao nosso Tribunal Superior Eleitoral. Até agora tem mais dois pré-candidatos e é provável que ainda teremos mais outros dois. Uma eleição com cinco candidatos, que é o que o Brasil tinha no período entre 1945 e 1960, quando ocorreram eleições no país a cada cinco anos.
 
E, arrisco afirmar aqui, que o Dr. Bashar será reeleito para mais um mandato de sete anos, e já no primeiro turno. Meu palpite é que ele obterá mais de 75% dos votos válidos. Ele é muito popular e muito querido pelo povo.
 
Eleições na Palestina
 

 

Governo palestino anuncia eleições (Foto: DW)

Vamos ainda comentar muito sobre as eleições na Palestina ocupada. Não ocorrem eleições por lá desde 2006, portanto há 15 anos. A Palestina vive a mais longa ocupação de um país por outro, na história moderna, desde que criou-se o Estado de Israel a partir de 14 de maio de 1948. Nestes 73 anos a ser completado em maio próximo, os palestinos foram ficando com cada vez menos terras sob o seu controle.
 
De qualquer forma, quero apresentar o calendário do processo eleitoral. A data das eleições parlamentares será no dia 22 de maio – sábado. Os dois partidos mais fortes para essas eleições legislativas – uma espécie de Câmara dos Deputados – são o A Fatah e o Hamas, que é mais forte na Faixa de Gaza e não integra a OLP.
 
Em seguida, no dia 31 de julho – também sábado, ocorrerá a sucessão na Autoridade Nacional Palestina – ANP, que funciona como uma espécie de Estado da Palestina, hoje sob a presidência de Mahmoud Abbas, de 85 anos. Não sei se ele se candidatará a mais um mandato. Ele que é um dos últimos remanescentes da fundação da OLP em 1965, junto com Yasser Arafat.
 
Por fim, no dia 31 de agosto – sábado, teremos eleições para o Conselho Nacional Palestino – CNP, que funciona como uma espécie de parlamento no exílio. O CNP é o órgão máximo de decisão da Organização para a Libertação da Palestina – OLP. Palestinos em todo o mundo escolhem seus representantes, que funcionam como deputados. O CNP tem funções distintas do que o Parlamento palestino tem, cuja eleição será em 22 de maio.
 
Vamos acompanhar de perto esse processo sucessório e daremos notícias em nossas colunas nos jornais e em nossos comentários nos programas semanas que temos nas TVs por streaming.
 
* Sociólogo, professor universitário (aposentado) de Sociologia e Ciência Política, escritor e autor de 14 livros, é também pesquisador e ensaísta. Atualmente exerce a função de analista internacional, sendo comentarista da TV dos Trabalhadores, da TV 247, da TV DCM, dos canais Outro lado da notícia, Iaras & Pagus, Rogério Matuck, Contraponto, Democracia no ar, Conexões, todos por streaming no YouTube. Publica artigos e ensaios nos portais Vermelho, Grabois, Brasil 247, DCM, Outro lado da notícia, Vozes Livres, Oriente Mídia e Vai Ali. Agradeço à Ademir Munhóz pelo trabalho de transcrição de meus programas internacionais ([email protected]). Todos os meus livros podem ser adquiridos na Editora Apparte no endereço: www.apparteditora.com.br e as compras podem ser parceladas em até seis vezes sem juros. O meu site pessoal é www.lejeune.com.br, onde estão todos os meus artigos, a maioria de política internacional e também política nacional e Sociologia brasileira. Recebo e-mails no endereço: [email protected]. Meu Zap é 5519981693145. Meus endereços nas redes sociais são: Facebook: www.facebook.com/lejeune.mirhan; Instagram: @lejeunemirhan; Twitter: @lejeunemirhan; Youtube: lejeunemirhan; VK: Lejeune Mirhan (vk.com).