O enriquecimento contínuo da cultura brasileira vem de sua própria força. A resistência dos criadores de cultura – seja da popular ou da erudita – foi sempre o grande remo que a impulsionou a romper rochas e correntezas. Exemplo disso é a Semana de Arte Moderna de 1922, símbolo maior dos diferentes “levantes” e movimentos de tomada de posição de seus criadores para defender e enriquecer a cultura brasileira.

A par do esforço de artistas e produtores, são inegáveis os impactos acarretados pelas políticas públicas – impactos positivos ou negativos, consoante o perfil das forças políticas que ao longo do tempo hegemonizaram o controle do Estado nacional. A questão que se apresenta é se nos últimos anos a cultura brasileira ganhou força ou não no âmbito deste ciclo virtuoso vivido pelo país.

A indagação procede, visto que nas últimas décadas a dimensão cultural fora tratada como algo “desimportante”. Essa irrelevância estúpida, ainda não de todo superada, se manifesta na escassez de recursos, na inexistência de políticas públicas de apoio, na visão utilitarista da arte. Menosprezo decorrente de uma “mentalidade colonizada”, que a renega para consumir e idolatrar o que vem de fora, ou de uma ignorância que não a concebe como direito indispensável à qualidade de vida das pessoas e componente destacado de um projeto nacional.

Vários indicadores demonstram que a cultura brasileira ganhou impulso e mais visibilidade nos últimos anos. Esse enriquecimento da paisagem cultural do país deriva, em grande medida, do novo papel desempenhado pelo Ministério da Cultura, fortalecido no governo Lula pelas gestões dos ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira. Foram promovidos avanços na maneira de conceituar cultura e na concepção das políticas públicas para o setor.

O Congresso Nacional aprovou o Plano Nacional de Cultura e se prepara para fazer o mesmo com o Sistema Nacional de Cultura. Duas importantes iniciativas que definem as diretrizes da política cultural, institucionalizam os avanços ocorridos e buscam criar uma interação entre o governo federal e os governos estaduais e municipais nas ações nessa área. Entre os programas desenvolvidos, para citar apenas dois exemplos, destacam-se os Pontos de Cultura e o Vale Cultura. Os “Pontos”, cerca de três mil espalhados pelo país, proporcionam a comunicação entres distintas manifestações culturais e lançam luzes sobre uma produção até então oculta ou restrita à própria comunidade. Já o “Vale” tem por objetivo enfrentar a vergonhosa exclusão de amplas parcelas do povo do consumo e da fruição cultural.

No âmbito do cinema, em 2010 foram vendidos mais de 23 milhões de ingressos para filmes brasileiros, o melhor resultado em duas décadas. Esse êxito deriva do talento de diretores e artistas e da capacidade empreendedora de produtores, mas também de políticas e programas de apoio emanados dos órgãos de Estado voltados ao setor, como o Ministério da Cultura e a Agência Nacional do Cinema (Ancine). A meta é o Brasil se tornar – como diz o diretor-presidente da Ancine, Manoel Rangel – "um grande centro produtor e programador de obras audiovisuais brasileiras". É claro que para isso ainda será necessário superar grandes problemas e vencer vários desafios.

Há décadas desprezada pelo Estado brasileiro, atitude que ainda prevalece na maior parte dos estados e municípios, há muito a se fazer para que a cultura compareça, com suas múltiplas dimensões, em um novo projeto nacional de desenvolvimento.

Persistir no reforço das instituições públicas que fomentam a produção cultural brasileira e sua circulação; estabelecer orçamento mínimo vinculado em todos os níveis de governo (2% para a União, 1,5% para estados, 1% para municípios); empreender uma relação sinérgica entre a política de cultura e as políticas de educação e comunicação são algumas das medidas indispensáveis.