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Duas Concepções, Duas Orientações Políticas (1960)

A Declaração de Março de 1958 não exprime uma política justa, não corresponde aos interesses de classe do proletariado.

No essencial, tal documento defende uma linha oportunista de direita. Exagera a importância do desenvolvimento do capitalismo, toda a sua orientação decorre desse desenvolvimento, está inteiramente a ele subordinada.

A declaração embeleza o capitalismo. Procura mostrar que a indústria brasileira atingiu elevado nível de crescimento e atribui tal crescimento ao capital nacional. Mas, na realidade, o imperialismo também participa desse processo de industrialização, domina ramos fundamentais da indústria do país.

O exagero na apreciação do papel do desenvolvimento capitalista no processo revolucionário, leva a Declaração a idealizar a burguesia, que é tratada como se fosse força conseqüente, capaz de defender até o fim os interesses nacionais.

Toda orientação estratégica e a linha tática expostas na Declaração têm em vista quase que exclusivamente os interesses da burguesia, conduzem ao fortalecimento de suas posições políticas, em prejuízo das demais forças revolucionárias.

Superestima a magnitude e a profundidade da contradição entre a burguesia e o imperialismo, como se a burguesia não pudesse chegar a acordos com os imperialistas.

Depois de proclamar, em palavras, que a revolução brasileira na presente etapa é antiimperialista e antifeudal, a Declaração logo em seguida faz nova caracterização da revolução. Esta passa a ser somente nacional e deve enfrentar unicamente as tarefas antiimperialistas.

Os objetivos de caráter democrático ficam inteiramente subordinados à contradição antiimperialista, que é considerada principal em toda a atual etapa histórica da sociedade brasileira. Assim, as tarefas democráticas são separadas mecanicamente dos objetivos nacionais e transferidas para outra etapa da revolução.

Daí resulta que, tendo em vista a frente única, a Declaração apresenta um esquema de disposição das forças revolucionárias que inclui até mesmo latifundiários e grupos da burguesia ligados a monopólios estrangeiros rivais dos monopólios norte-americanos.

Tal disposição de forças corresponde a uma revolução exclusivamente nacional. Portanto, a solução da questão agrária deixa de ser uma das tarefas da revolução.

É verdade que, em determinadas circunstâncias, latifundiários e setores da burguesia ligados aos imperialistas rivais dos norte-americanos, podem participar de certas ações contra o imperialismo ianque. Mas isto somente por objetivos limitados e por períodos relativamente curtos.

Querer incluí-los na frente única democrática e antiimperialista seria incorrer em grave erro. Como assegurar na frente única a permanência simultânea de latifundiários e camponeses se os últimos – segundo as Teses(2) – estão “interessados em liquidar uma estrutura agrária retrógrada que tem apoio na exploração imperialista?”.

Além disso, subordinando inteiramente as reivindicações democráticas ao fator nacional, a Declaração, ao invés de ampliar a frente única, como aparentemente pode parecer, não faz mais do que restringi-la. Isto porque será difícil, ou mesmo impossível, trazer as grandes massas camponesas para uma frente única em que participem latifundiários.

Tal fato poderia ocorrer se o país atravessasse uma situação que pusesse em perigo toda a nação, como no caso de agressão ou ocupação militar estrangeiras, quando os interesses de todas as camadas sociais estão diretamente ameaçados. Mas tal coisa não acontece no Brasil.

Do ponto de vista tático, em determinadas ocasiões, a classe operária e seu partido podem, na ação prática, não dar muita ênfase às reivindicações agrárias de caráter radical e unir-se a latifundiários que têm contradições com os imperialistas norte-americanos e com setores da burguesia ligados a grupos monopolistas que concorrem com os monopólios ianques.

Mas, se se tem em conta que o núcleo da frente única é constituído pela classe operária e os camponeses, que o fundamental para a frente única é atrair para ela as amplas massas trabalhadoras das cidades e do campo, é errado colocar de maneira absoluta, nas condições atuais do Brasil, a predominância dos objetivos nacionais em detrimento das reivindicações democráticas.

Do conteúdo da Declaração depreende-se que tem mais valor para a formação da frente única a aliança com a burguesia do que os camponeses e a pequena burguesia urbana, colocados em plano muito secundário.

A própria classe operária não é devidamente considerada, uma vez que suas reivindicações são inteiramente subestimadas. Por esse caminho não se atrairá as grandes massas do povo, jamais se forjará a frente única democrática e antiimperialista.

Em outras palavras, a Declaração proclama a necessidade da hegemonia do proletariado na revolução. Mas essa questão não é somente um problema de definição.

É um problema prático que, antes de tudo, se refere aos aliados da classe operária. Mais concretamente, quem exercerá influência sobre os camponeses e os dirigirá? O proletariado ou a burguesia?

A Declaração, ao dar absoluta primazia ao lado antiimperialista da revolução brasileira, em detrimento de seu aspecto agrário, estabelece de fato uma linha de renúncia à direção do movimento revolucionário por parte do proletariado, porque tal orientação dificulta a mobilização dos camponeses, entrava o processo de formação da aliança operário-camponesa, fator decisivo para que a classe operária conquiste a hegemonia na revolução.

Oportunismo de Direita da Declaração de Março de 1958

As tendências oportunistas de direita da Declaração se manifestam com maior nitidez na questão do poder – problema fundamental da revolução.

Partindo da justa constatação de que atualmente não há condições para alcançar um governo democrático e antiimperialista, a Declaração chega a uma conclusão falsa ao abdicar por completo da luta por esse objetivo, limitando-se a reivindicar modificações parciais na política e na composição de sucessivos governos, nos marcos do regime vigente.

Com essa tática gradualista, evolucionista, que contraria frontalmente a teoria marxista-leninista do Estado, pretende-se atingir um poder capaz de enfrentar as tarefas da revolução na presente etapa, o que equivale a afirmar que se conseguirá transformar o atual regime, em essência reacionário, num regime democrático e antiimperialista e, por extensão, o próprio capitalismo em socialismo.

A Declaração considera que as forças revolucionárias chegarão ao poder através da acumulação de reformas profundas e conseqüentes na estrutura econômica e nas instituições políticas. Mas como acumular tais reformas no atual regime e com o poder nas mãos das forças reacionárias?

A Declaração indica um caminho idílico em que irão sendo gradativamente retirados do governo os elementos reacionários e, também, gradativamente, irão ingressando no governo elementos progressistas, até que um dia se chegue a conquistar um poder democrático e antiimperialista.

Afirma a Declaração que a democratização é uma tendência permanente na vida política nacional, uma decorrência do desenvolvimento do capitalismo. Assim, a democracia aparece como inerente ao capitalismo, tese tipicamente revisionista.

Além disso, é uma afirmação que não corresponde à realidade e leva ao embelezamento do capitalismo. Em 38 anos de existência, o Partido da classe operária só teve dois anos de vida legal; as organizações sindicais estão jungidas ao Ministério do Trabalho e quando se dispõem a uma ação independente, e não declarações verbais que não têm correspondência com a prática, são ameaçadas de intervenção e fechamento; o rádio e a televisão – meios mais modernos e eficientes de propaganda – são privilégios dos homens do poder; cidadãos suspeitos de serem comunistas são impedidos de se candidatar a postos eletivos; grandes massas do povo, principalmente os camponeses, por uma série de restrições, não participam na vida política do país.

Algumas liberdades existentes, fruto da continuada e árdua luta do povo, são de tal forma generalizadas e exaltadas na Declaração, que se tem a impressão de que o Brasil vive numa autêntica democracia.

A Declaração prega a “via pacífica” da revolução

No que concerne ao caminho da revolução, a Declaração afirma que o Brasil é um dos países para o qual se abre a possibilidade real da via pacífica.

Partindo de uma análise profundamente subjetiva, traça um caminho róseo, sem comoções sociais e choques violentos para realizar as tarefas da revolução. Levando ao absoluto a possibilidade do caminho pacífico, na prática, a Declaração o torna de fato o único caminho.

Toda a orientação que estabelece é baseada nesse caminho, desarmando, assim, o proletariado e seu Partido para qualquer outra eventualidade.

Por isso, a advertência, feita de passagem, de que no caso dos inimigos empregarem a violência é indispensável ter em vista a solução não-pacífica, não tem a menor significação.

Embora, na presente situação do mundo, se deva ter em conta a viabilidade do caminho pacífico, não se pode, nas condições brasileiras, torná-lo absoluto.

Os comunistas preferem esse caminho. Mas cometeriam grave erro se nele apoiassem toda a sua atuação, porque nada ainda tem comprovado que o caminho da revolução brasileira seja o caminho pacífico.

A experiência passada e recente dos países da América Latina mostra que não foi pacífico o caminho para derrubar a ditadura.

Mesmo no Brasil, a prática mostra que as mudanças na estrutura econômica do país ou nas instituições políticas, não se fizeram sem o apelo à força armada, embora nem sempre se verificassem choques sangrentos.

A Declaração de Março de 1958 é, assim, um documento que encara os problemas da revolução brasileira do ponto de vista da burguesia, conduz à negação da luta revolucionária, à adaptação ao capitalismo e ao evolucionismo sob o disfarce de caminho pacífico. Isso favorece a penetração da ideologia burguesa entre as massas, o que dificulta ganhá-las para as posições do proletariado.

A atividade dos comunistas a partir de Março de 1958

Em sua atuação prática, os comunistas têm alcançado alguns êxitos. Nas últimas campanhas eleitorais, de um modo geral, tiveram uma participação ativa.

Enfrentando as restrições antidemocráticas que tolhem sua ação política, o Partido, em alguns lugares, ajudou a formar coligações que asseguraram a vitória de candidatos nacionalistas.

Elegeu também inúmeros candidatos comunistas que concorreram aos postos eletivos sob diferentes legendas partidárias. Apesar das deficiências apresentadas em sua atividade, os comunistas têm contribuído para fortalecer a organização sindical da classe operária e para fazer avançar o processo de sua unificação.

Ocuparam lugar de destaque nas lutas pelas reivindicações dos trabalhadores, particularmente no que se refere ao aumento de salário e contra a carestia de vida. Os comunistas ajudaram a impulsionar as lutas patrióticas, realizando ações unitárias com outras forças, o que contribuiu, de certo modo, para fortalecer o movimento nacionalista.

Estes êxitos, porém, são relativamente pequenos se se tiver em conta as condições bastante favoráveis existentes no país para o avanço do movimento democrático e antiimperialista e para o crescimento do Partido.

A prática destes últimos dois anos tem revelado com bastante nitidez o caráter oportunista da atual orientação. Esta tem levado o Partido à renúncia de uma posição independente, tanto no terreno político quanto no ideológico.

De um modo geral, a posição do Partido é de reboque em relação às forças aliadas, em particular, à Frente Parlamentar Nacionalista e ao PTB. Subestima-se o Partido sob o pretexto de fortalecer a frente única. Se é falso encarar com reservas ou hostilidade o movimento nacionalista, considerando que a participação nele significa submeter-se à hegemonia da burguesia, o Partido não pode deixar de fazer-se ouvir no seio das massas e na vida política brasileira, de aparecer com sua verdadeira fisionomia de partido de vanguarda da classe operária. É muito fraca a atuação política do Partido.  

Os comunistas, atualmente, se satisfazem com a defesa que os aliados realizam dos objetivos comuns da frente única. Para as grandes massas não são claras as palavras-de-ordem do Partido.

Sem jornais diários, sem parlamentares que falem em seu nome, contando com pequeno número de dirigentes conhecidos, o Partido se dilui no movimento geral da frente única, não consegue atrair nem os setores mais esclarecidos dos trabalhadores para as fileiras partidárias, nem as massas para sua orientação.

A posição do Partido face ao governo do senhor Juscelino Kubitschek é dúbia. Durante longo período não se fez nenhuma crítica ao governo.

Quando os dirigentes comunistas vieram para a atividade pública legal, foram dadas entrevistas que implicavam praticamente no apoio em bloco à política governamental.

Posteriormente, começou-se a apoiar os lados positivos do governo e a criticar os negativos, mas dava-se tanta ênfase ao apoio e as críticas eram tão tímidas e inconseqüentes que, para as massas, a posição dos comunistas se apresentava como favorável ao governo. É característico que, depois do combate à política econômico-financeira do governo, se tenha passado a combater unicamente certos aspectos dessa política.

A apresentação de soluções positivas sem que, simultaneamente, se desenvolva a crítica à política do governo, transforma, os comunistas na prática, em seus colaboradores.

A ação dos comunistas que assume maior relevo tem sido a de apoiar. Geralmente, apóiam promessas que não se tornam realidade ou medidas de fachada que logo são anuladas por outros atos reacionários.

Tudo isso contribui para que amplos setores do Partido tenham uma atitude de conformismo, de passividade ou mesmo de concordância diante do governo. Se não se combate energicamente a política errônea do governo, as forças mais reacionárias utilizarão em seu favor, como já vêm fazendo, o descontentamento popular.

A orientação de luta por um governo nacionalista e democrático, através de sucessivas mudanças na política e na composição do atual governo, vem fracassando. O que se conseguiu com a aplicação dessa tática? No que se refere à política do governo, esta se mantém, no fundamental, antipopular e de capitulação ao imperialismo norte-americano.

No que concerne às modificações na composição do governo, se é certo que saíram da pasta da Fazenda o senhor Lucas Lopes e, do BNDE, o senhor Roberto Campos, verdade é também que ingressaram no ministério os senhores Armando Falcão, Amaral Peixoto, Horácio Lafer, Paes de Almeida, além do senhor Lúcio Meira, na direção do BNDE. Na realidade, as mudanças verificadas no governo fortaleceram as posições dos reacionários e entreguistas.

Nestes últimos meses, levada pelos próprios acontecimentos e pela pressão da crítica dos militares, a direção nacional, sem explicação e qualquer espírito autocrítico, procura fazer certas modificações na posição do Partido face ao governo, levando, assim, a confusão às fileiras partidárias.

Na atividade prática, subestima-se a luta pela reforma agrária, sob o pretexto de não prejudicar a ação contra o imperialismo norte-americano.

Enquanto diversas correntes e partidos políticos desfraldavam a bandeira da reforma agrária, os comunistas reduziam a questão camponesa a medidas de reforma agrária ou escondiam a palavra-de-ordem de reforma agrária.

Dificuldades na organização partidária

Orientando-se pela atual linha política, o Partido na sua atuação não se distingue dos demais partidos que têm posição nacionalista. Para as massas o Partido não se apresenta como partido do socialismo mas, como partido do nacionalismo, com objetivos bastante limitados, o que entrava o ingresso em suas fileiras das pessoas que são despertadas para o comunismo pelas grandes vitórias do sistema socialista, particularmente da União Soviética e da China Popular.

No que se refere à vida interna do Partido, vêm sendo alcançados alguns resultados positivos. As eleições para escolher as direções partidárias estão se tornando norma. As alterações na estrutura do Partido, de acordo com a divisão administrativa do país, vêm possibilitando maior integração dos organismos regionais e locais na vida política.

Mas a vida orgânica do Partido é muito precária. Não há preocupação com o funcionamento das organizações de base e com a construção do Partido. De outra parte, os próprios militantes manifestam pouco interesse pelas reuniões.

Em alguns setores do Partido, registram-se tendências a abandonar o trabalho nos organismos e a se limitar exclusivamente à ação nas organizações de massa, a afrouxar os vínculos partidários e a subestimar a disciplina.

Organizações de base e direções intermediárias renunciam ao seu papel de vanguarda e se transformam em simples auxiliares das organizações de massa. Embora os métodos de direção tenham melhorado em virtude das exigências do conjunto dos militantes, o trabalho coletivo dos órgãos dirigentes ainda é muito deficiente.

A própria Declaração de março de 1958 foi obra de um pequeno grupo de camaradas, elaborada à revelia dos membros do Comitê Central e apresentada de surpresa a esse órgão dirigente na reunião em que foi aprovada.

Mais séria ainda é a situação no terreno ideológico. Circulam no Partido idéias estranhas ao proletariado sem o necessário combate. É grande e intensa a penetração da ideologia burguesa no movimento comunista.

No entanto, em quase todos os Comitês Regionais o trabalho de educação dos militantes e a defesa do marxismo-leninismo foram abandonados. Paralisou-se o trabalho de edição de livros marxistas, deixando-se o campo aberto para as idéias da pequena ou do imperialismo. As teorias defendidas pelas publicações e instituições culturais burguesas invadem as fileiras partidárias sem oposição.

A negligência no trabalho ideológico e as posições oportunistas, resultantes da linha política, levam ao enfraquecimento do espírito de partido, à perda da combatividade, da capacidade de luta e de sacrifício dos militantes.

Essa situação mostra que, na luta ideológica, embora se deva prosseguir no combate às concepções sectárias e esquerdistas para melhorar as relações entre o Partido e as massas e fazer avançar o processo de formação da frente única, o fundamental, agora, é golpear as tendências oportunistas de direita que constituem o principal perigo.

Tudo isso impõe a necessidade de mudar de rumo, de substituir a atual orientação do Partido por uma nova linha que corrija os erros de direita, sem incidir nos velhos erros esquerdistas e sectários. Com esse fim, partindo de um ponto de vista de classe do proletariado, é preciso analisar a situação objetiva do país, caracterizar a revolução brasileira e definir suas tarefas, e estabelecer a tática com vistas a alcançar as reivindicações programáticas da presente etapa da revolução.

Sem pretender dominar a verdade sobre problemas tão complexos e difíceis, apresento, como contribuição ao debate, minha opinião sobre tais questões, a qual considero uma posição bem diversa da que vem sendo seguida pelo Partido.

Uma defesa falsa de uma linha oportunista

Mas, as Teses e a Declaração de 1958, ao tentar a inovação, caem no gradualismo oportunista. Admitem que o Brasil é um dos países para o qual se abre a possibilidade real da via pacífica. Baseiam-se, no entanto, em premissas que, quando não são falsas, são hipóteses ou constatações unilaterais.

Assim, a tese da “democratização crescente da vida política” não corresponde à realidade. Embora o país, atualmente, viva num clima de relativa liberdade, não se pode assegurar a democratização como uma tendência permanente na vida brasileira, uma vez que as forças reacionárias se mantêm no poder e sempre que seus interesses são atingidos, apelam para a violência e atentam contra as liberdades democráticas, como tem se verificado em vários pontos do país.

No que tange ao “ascenso do movimento operário”, ainda que tenha grande influência no curso dos acontecimentos políticos, a verdade é que a unidade e a organização da classe operária estão num nível tão pouco desenvolvido que não podem servir de base para se proclamar a existência de uma possibilidade real do caminho pacífico.

Não se pode também basear essa possibilidade no “desenvolvimento da frente única nacionalista e democrática”, porquanto as próprias Teses (item 26) afirmam que “o movimento nacionalista é, em certo grau, fluido e disperso” e as forças que o compõem “não seguem um plano unificado de ação nem mesmo possuem uma plataforma comum”.

São, por isso, inconsistentes as premissas em que se apóia a Declaração para fundamentar o caminho pacífico. Em conseqüência, idealiza o caminho da revolução antiimperialista e antifeudal.

“O povo brasileiro – afirma aquele documento – pode resolver pacificamente os seus problemas básicos com a acumulação gradual, mas incessante, de reformas profundas e conseqüentes na estrutura econômica e nas instituições políticas, chegando até a realização completa das transformações radicais colocadas na ordem-do-dia pelo próprio desenvolvimento econômico e social da nação”.

Poder-se-ia traçar um quadro mais róseo, evolucionista e reformista para a marcha da revolução brasileira? A seguir, a

Declaração diz ser preciso para avançar nesse caminho a conquista de um governo nacionalista e democrático. As Teses indicam os meios prováveis para conquistá-lo: a) pressão pacífica de massas para afastar do poder os entreguistas e substituí-los por nacionalistas; b) pela vitória dos candidatos nacionalistas e democratas nos pleitos eleitorais; c) pela ação das massas e dos setores nacionalistas do Parlamento, das Forças Armadas e do governo contra as tentativas de golpe dos entreguistas e reacionários.

O rumo precário da Declaração e das Teses

São bastante discutíveis esses meios prováveis de conseguir um governo capaz de “encaminhar a solução dos problemas vitais do povo brasileiro”.

Além disso, as três soluções são apresentadas desligadas umas das outras. Vacilando, em relação à eficácia de tais meios, as Teses mais adiante afirmam acacianamente que “o complexo desenvolvimento da vida nacional é que determinará os meios concretos para a conquista de um governo nacionalista e democrático”.

Em linguagem de simples mortais: tudo pode acontecer, mas os meios prováveis para conquistar aquele governo são os mesmos que se encontram nas Teses.

Por essas veredas, o Partido não irá longe. Se a prática é o supremo critério da verdade, qual a experiência concreta, uma vez que tais meios prováveis já constavam da Declaração? O balanço dos progressos obtidos em mais de dois anos de aplicação dessa tática é melancólico.

O governo do Sr. Juscelino Kubitschek, como foi visto acima, tem hoje, do ponto de vista da democracia e da luta antiimperialista, uma composição bem pior do que no início de 1958. Isto mostra o quanto é precário o rumo traçado na Declaração e nas Teses no concernente ao caminho pacífico.

(Texto escrito em abril e junho de 1960 por Maurício Grabois – jornalista, constituinte de 1946, dirigente comunista morto na Guerrilha do Araguaia.)